"No Egito as bibliotecas eram chamadas Tesouro dos remédios da alma. De fato é nelas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras.”

(Jacques Bossuet).

terça-feira, 24 de abril de 2012

Com o que ou com quem você se identifica?

identificação

Em Psicologia define-se identificação como: um processo psicológico pelo qual um sujeito assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo desse outro.

Estou trazendo este tema para reflexão porque tenho notado que nos últimos anos, após o advento do culto à imagem, está havendo muita identificação, principalmente por parte dos jovens, com figuras que aparecem na mídia.

Pode se confundir empatia com identificação, mas são diferentes. Empatia é sentir com o outro, identificação é sentir e/ou agir como o outro e pode ser uma característica doentia. Por ex: você se identifica muito com um amigo e quando ele está com dor na coluna, você também passa a sentir dor.

Na adolescência é até considerado “normal” a identificação por tratar-se de uma fase de transição, onde o ser ainda não estabeleceu sua identidade completamente, mas passada esta época a identificação pode assumir um aspecto preocupante. Aqui não me refiro à identificação “normal” (sem caráter de mecanismo psicológico) como por ex. identificar-se com outro indivíduo porque ambos são da mesma espécie: humanos.

A identificação não precisa ser necessariamente com outra pessoa/s, lembro-me com horror de um programa de TV que assisti faz tempo onde aparecia uma jovem americana que fez uma infinidade de cirurgias plásticas para ficar “igual” à Barbie.

Também é bem comum a identificação com as massas em determinadas circunstâncias. Um mestre já disse: “Alguém vai andando por uma rua, de repente se encontra com as turbas que vão protestar por algo ante o palácio do Presidente. Se não está em estado de alerta (auto-observação) identifica-se com o desfile, mescla-se com as multidões, fascina-se e a seguir vem o sonho: grita, lança pedras, faz coisas que em outras circunstâncias não faria, nem por um milhão de dólares”.

A esse fenômeno Freud dizia ser trocar o ideal de ego pelo ideal de massa e também afirmava que o irreal sempre prevalece sobre o real (este assunto dá um livro ...).

Portanto identifica-se um tripé neste tema: identificação – fascinação – sonho (o irreal). É muito fácil deixar-se levar pela fascinação. A fascinação nos remove, ainda que por instantes, da banalidade e/ou mesmice do dia a dia e aí reside o perigo de se resvalar para o sonho (o irreal).

Para ser honesta, antes de continuar, devo lembrar a todos que as religiões sempre pregaram a dissolução do indivíduo em favor do bem maior de todos (!?). Nos foi ensinado que pensar primeiro em si é egocentrismo e contrário às leis cristãs. Isto acabou por gerar “seres catatônicos, acéfalos que seguem os meandros da passividade e do conformismo”. (Fábio Cardoso Lopes) Bem, nem tanto, mas que a frase é de efeito, lá isso é ...rsrs

Exageros de lado, em muitas situações e/ou culturas encontramos exatamente isso, pessoas que se deixam levar pelos seus governantes, pelos seus pastores ou padres e finalmente pela mídia (“ser” onipresente nos dias atuais) o que as induz à identificação com aqueles que são “exemplos”. Já no seio da juventude vemos os jovens, e até crianças, identificando-se com astros da música e do futebol. Usam as mesmas roupas e penteados de seu “ídolo”, repetem as frases das pseudo-músicas tão em voga atualmente e por aí vai.

Não existe mais originalidade, todo mundo vai na “onda” do que está na moda sem parar para refletir se lhe é adequado ou não, se é saudável ou não, se é ridículo ou não.

A identificação com as massas é sempre perigosa, desde aquela com astros pop drogados a outras de caráter violento que ocorrem nas convulsões político-sociais.

Os indivíduos em vez de estarem identificando entre si, estão identificando com a totalidade social irracional. Os indivíduos têm de dar conta da falsidade de sua própria condição: ser objeto e não sujeito em uma tal realidade em que ele se amolda à dominação social.” (Dulce Regina dos Santos Pedrossian)

É impossível que alguém possa despertar a consciência se se deixar fascinar, se cair no sonho.

Imagem: tribosurbanas23.blogspot.com

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quarta-feira, 18 de abril de 2012

Obesidade mental

obesidade

Recebi o texto por e-mail, sem identificação do autor, que trata de um assunto muito a propósito quanto aos dias atuais. Algumas partes do texto me pareceram um tanto preconceituosas, portanto não o posto aqui por inteiro, mas no geral o autor está muito certo no que diz. Vamos expandir a consciência refletindo sobre o exposto.

O prof. Andrew Oitke, catedrático de Antropologia em Harvard, publicou em 2001 o seu polêmico livro Mental Obesity, que revolucionou os campos da educação, jornalismo e relações sociais em geral.

Nessa obra introduziu o conceito em epígrafe para descrever o que considerava o pior problema da sociedade moderna.

Há apenas algumas décadas, a Humanidade tomou consciência dos perigos do excesso de gordura física decorrente de uma alimentação desregrada. É hora de refletir sobre os nossos abusos no campo da informação e do conhecimento, que parecem estar dando origem a problemas tão ou mais sérios do que a barriga proeminente.

Segundo o autor, a nossa sociedade está mais sobrecarregada de preconceitos do que de proteínas e mais intoxicada de lugares-comuns do que de hidratos de carbono. As pessoas se viciaram em estereótipos, em juízos apressados, em pensamentos tacanhos e em condenações precipitadas.

Todos têm opinião sobre tudo, mas não conhecem nada. Os "cozinheiros" desta magna fast food intelectual são os jornalistas os articulistas, os editorialistas, os romancistas, os falsos filósofos, os autores de telenovelas e mais uma infinidade de outros chamados "profissionais da informação".

Os telejornais e telenovelas estão se transformando nos hamburgers do espírito. As revistas de variedades e os livros de venda fácil são os donuts da imaginação. Os filmes se transformaram na pizza da sensatez.

Qualquer pai responsável sabe que os seus filhos ficarão doentes se abusarem dos doces e chocolates. Não se entende, então, como aceitam que a dieta mental das crianças seja composta por desenhos animados, por videojogos que se aperfeiçoam em estimular a violência e por telenovelas que exploram, desmesuradamente, a sexualidade. Com uma 'alimentação intelectual' tão carregada de adrenalina, romance,violência e emoção, é possível supor que esses jovens jamais conseguirão viver uma vida saudável e regular.

Um dos capítulos mais polêmicos e contundentes da obra, intitulado "Os abutres", afirma: o jornalista alimenta-se, hoje, quase que exclusivamente de cadáveres de reputações, de detritos de escândalos e de restos mortais das realizações humanas. A imprensa deixou há muito de informar, para apenas seduzir, agredir e manipular.

O texto descreve como os jornalistas e comunicadores em geral se desinteressam da realidade fervilhante, para se centrarem apenas no lado polêmico e chocante.

Só a parte morta e apodrecida ou distorcida da realidade é que chega aos jornais.

O conhecimento das pessoas aumentou, mas é feito de banalidades. Todos sabem que Kennedy foi assassinado, mas não sabem quem foi Kennedy. Todos dizem que a Capela Sistina tem teto, mas ninguém suspeita para quê ela serve. Todos conhecem que Pitágoras tem um teorema, mas ignoram o que é um cateto.

Não admira que, no meio da prosperidade e da abundância, as grandes realizações do espírito humano estejam em decadência. A cultura banalizou-se e o folclore virou "mico". A arte é fútil, paradoxal ou doentia.

Floresce, entretanto, a pornografia, o cabotinismo, a imitação, a sensaboria e o egoísmo. Não se trata nem de uma era em decadência, nem de uma 'idade das trevas' e nem do fim da civilização, como tantos apregoam. Trata- se, na realidade, de uma questão de obesidade que vem sendo induzida, sutilmente, no espírito e na mente humana.

O homem moderno está adiposo no raciocínio, nos gostos e nos sentimentos.

Imagem: exercite-se.com.br

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quarta-feira, 11 de abril de 2012

O que não tem preço




Recebi este pps e por considerar que traz um bom assunto para reflexão quis partilhá-lo com vocês. Esteticamente também está muito bonito.

Reconheço que o horário em que todos vão para o trabalho é corrido, mas será que algumas pessoas não teriam alguns minutinhos para apreciar a boa música que lhes estava sendo oferecida de graça? E se chegassem um pouco atrasados ao trabalho, seria tão catastrófico assim? Eu até convidaria meu chefe para ir até à estação do metrô apreciar também. Afinal nada melhor do que começar o dia com música e funcionários bem dispostos produzem mais e melhor.

Vivendo neste atual mundinho caótico precisamos e devemos ter momentos como os que foram ofertados por esse artista.

A alegria da vida definitivamente não tem preço, não se compra. Reflitam sobre como estão levando suas vidas...



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segunda-feira, 2 de abril de 2012

Existe maldade gratuita?

maldade

Postei há pouco tempo uma matéria sobre uma experiência que foi denominada “Efeito Lúcifer” onde descobrimos que pessoas comuns, numa situação onde podiam exercer poder arbitrário e legal sobre outras, tornaram-se cruéis torturadores.

Hoje vamos adentrar um pouco mais neste campo, o da crueldade, maldade ou perversidade, como queiram chamar. Por que estou postando sobre este tema? Porque tomando conhecimento dos noticiários atualmente percebemos que os atos ditos maus ou cruéis estão se tornando um lugar comum em distintas partes do globo. Seja em regimes totalitários (Síria, por ex.), seja em países democráticos (Brasil, onde se queimam moradores de rua). Em vista disso é útil saber os porquês das pessoas agirem assim para, se possível, prevenir.

Ao indivíduo comum, normal, bem comportado parece que o mundo enlouqueceu. Será? Vejo duas possibilidades de resposta: 1) a crueldade sempre existiu, somente que agora temos amplo e imediato acesso, ou quase, aos fatos que ocorrem na sociedade planetária ou 2) mais pessoas estão “saindo dos trilhos” porque não estão aguentando as mudanças que ora ocorrem no planeta (a consciência está aumentando, e sendo ela luz, acaba trazendo à tona a escuridão que existe em cada um).

Freud atribuía a maldade à pulsões (conceito vago e difícil de entender) eu prefiro, segundo a Análise Transacional, atribuí-la à Criança Interior. Nossa criança interna é amoral, como qualquer criança pequena o é, carente de juízos de valor. Os pequenos não sabem que estão causando algum mal ao gato quando puxam o rabo dele. Os conceitos de bem e de mal vão se instalando em nossa psique conforme vamos crescendo. Na idade adulta, para alguns, ter seu objetivo alcançado transcende seus conceitos e/ou valores internalizados.

Trarei aqui algumas contribuições de um excelente trabalho (Tese de Mestrado de Marie Danielle Brülhart Donoso – Estudo psicanalítico sobre a gramática da maldade gratuita). Seus excertos serão colocados em cor e fonte diversas.

Autores citados na tese mencionada trazem diferentes abordagens à questão da crueldade. Gostei do enfoque de Hannah Arendt que considera que o mal é a absoluta falta do pensar (em profundidade). Em decorrência desse pensamento cunhou a expressão mal banal ou banalidade do mal. Ela chegou à sua conclusão a partir do estudo que realizou sobre os nazistas. Esteve presente, inclusive, nos julgamentos de Nuremberg. Esta “falta do pensar” nada mais é do que falta de reflexão ou, por extensão, falta de consciência evoluída.

Neste exemplo pode-se constatar a ausência de reflexão (depoimento de um soldado sobre os extermínios na ex-Iugoslávia): “A gente mata, e depois que a gente matou [...] temos que continuar matando sem parar, em ação sem parar, tiros sem parar, dedo no gatilho sem parar [...]. O importante é uma certa eficiência, uma coisa puramente, puramente empírica: não há muita filosofia, nem muita reflexão sobre o porque matei. É isso. (Welzer, 2007, p. 276).”

“Arendt não acredita que exista um Eichmann em cada um de nós, mas suas características é que se multiplicariam em sociedades de massa, inclinadas ao não exercício do pensamento e à falta de profundidade. (grifo meu) “Não pensar é também negar a si a responsabilidade pelos seus atos e é justamente quando não refletimos sobre o mal que podemos realizá-lo, quando anestesiamos a criticidade.” (Adilson Silva Ferraz)

Hannah Arendt dizia que “Os campos (de concentração nazistas) são a única forma de sociedade onde é possível dominar o homem inteiramente, mas conforme vimos no Experimento de Zimbardo - o Efeito Lúcifer, isso é possível em outras circunstâncias, desde que estejam presentes os elementos propiciadores.

Além do fato de não pensar, outro elemento vem propiciar o surgimento da bestialidade nos seres humanos: fazer parte de uma “massa” humana.

Heinrich Himmler num de seus discursos: Nós tínhamos o direito moral, nós tínhamos o dever em relação ao nosso povo, de matar esse povo que queria nos matar. Não é um “eu” que mata, é um “nós”. (Welzer, 2007, p. 282).”

Assim fica mais fácil, não é? Um “nós” ao invés de um “eu”.rsrs

Quando o indivíduo faz parte de um grupo, grande ou até mesmo pequeno, ocorre o que Freud se referia como abdicar do ideal de ego pelo ideal de massa ou como disse Marie Danielle: “[...] o anonimato da massa – facilita uma suspensão da repressão e um apagamento da consciência moral e do sentimento de responsabilidade.”

Novamente aí observamos a falta de reflexão e consciência evoluída, pois um indivíduo altamente consciente escolherá o caminho a agir de acordo com seus princípios éticos e não se deixará levar pela turba.

Um terceiro elemento encontrado na manifestação da violência ou crueldade é a segregação, o catalogar-se, e aos demais, por nação, etnia, credo, orientação sexual, etc.

Sobre o massacre de My Lai, Vietnã : “Aterrissamos em outro planeta. Ninguém tem a menor ideia do que falam. Ninguém tem o menor sentimento pelos vietnamitas. Não são seres humanos. Então, pouco importa o que você faça deles. (Welzer, 2007, p. 239).”

Vemos no noticiário: pai e filho espancados por suposição de serem gays; templos espíritas e umbandistas são atacados por religiosos de outra fé, moça agredida brutalmente por terem suposto que era prostituta, roubos seguidos de morte quando as vítimas nem sequer reagiram, assassinato de crianças numa escola por fanático islâmico e por aí vai a insana fúria dos intolerantes que não conseguem aceitar as diferenças, que se consideram donos da verdade ou baluartes de sua fé, que se supõem superiores por sua raça ou status social.

Os requintes de bestialidade mais atrozes acompanham o homem ao longo de toda sua história e a aculturação, o progresso e a ciência não proporcionaram a hegemonia da civilidade nem garantiram o primado da razão.”

A vida em sociedade impõe restrições aos nossos impulsos primitivos que quando chegam a um limiar crítico irão se descarregar, por exemplo, através da violência. Uma das formas de descarregar os impulsos primitivos seria, o que é tão comum atualmente, hostilizar minorias “diferentes”.

Enfim, não podemos dizer que exista maldade gratuita porque toda ação humana tem algum motivo por trás. . Vejamos o exemplo de um torturador que gosta do que faz, ele pode estar desrecalcando no torturado os maus tratos ou falta de amor que sofria na infância.

A psique humana é muito complexa e sempre devemos levar em conta que, muitas vezes por detrás de uma aparência polida, reside um ogro primitivo que pode emergir a qualquer momento. Esse é o ser humano nem besta, mas também nem anjo. Enquanto vivermos na dualidade assim será.

Reflitam sobre isso.

Imagem: rumoatolerancia.fflch.usp.br

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