"No Egito as bibliotecas eram chamadas Tesouro dos remédios da alma. De fato é nelas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras.”

(Jacques Bossuet).

domingo, 20 de junho de 2010

O tripé da tragédia humana: culpa

culpa

Chegamos ao último elemento do tripé: a culpa.

A culpa é um legado trágico das religiões.

O ser humano sempre teve contato com o Espírito (o Criador), pois nós somos parte Dele. Contudo quando se estabeleceu a primeira religião sobre a face da terra, devido ao fato da comunicação com o divino não ser cem por cento acurada, o dito cujo, futuro sacerdote ou sacerdotisa, não entendeu direito ou distorceu por conta própria o que recebia da Fonte e partiu para o estabelecimento de regras. Não sei quantas regras ou “mandamentos” havia nessa primeira religião fundada, mas com certeza as havia, sim, pois nossa história registrada o mostra desde o princípio. Essa criatura, sacerdote ou sacerdotisa, inventou que a divindade gostava disso, mas não gostava daquilo, aprovava isso, mas não aprovava aquilo e assim por diante. Aff...

De lá pra cá as regras foram aumentando e ao chegar o advento da religião judaico-cristã, com os 10 mandamentos e suas estórias de punição e ira de Deus a coisa saiu do controle.

Como se não bastasse a fúria punitiva já contida no Velho Testamento, a religião católica aumentou-a mais ainda e chegamos à Idade Média onde a Inquisição deitou e rolou. Vem depois a fúria dos protestantes, depois a das demais religiões ditas evangélicas (é de chorar o que se lê no livro Hawaii de James Michener: o que fizerem com os nativos para impor sua evangelização).

Bom, e assim chegamos aos dias de hoje onde a maior parte da população terráquea vive cheia de culpas, oriundas de suas crenças invalidantes e que contribuem enormemente com a baixa auto-estima.

Constatei na prática clínica que o pior de tudo é que as pessoas se vêm num círculo vicioso sem saída: se sentem culpadas porque fizeram algo “errado” e sabem que vão “errar” de novo porque não conseguem evitá-lo e que sentirão mais culpa ainda. Ufa! Ou seja, estão sendo simplesmente humanas, mas não conseguem aceitar isso porque está muito entranhado em seu DNA que: ERRAR É ERRADO! Durma-se com um barulho desses.

As pessoas conectam intrinsecamente culpa com erro. Não se dão conta de que é o modo como percebemos o erro que gera a culpa.

Errar não está errado, errar é uma forma de termos uma chance de aprender algo, experienciar algo que pode vislumbrar a oportunidade de mudança.

O ser humano está aqui na Terra para criar e experienciar. Mas este é um papo para futuro post.

Muitos dirão que não fazem parte deste bloco: o dos culpados. Então digo que dêem uma olhada com mais cuidado nas suas doenças. Somatização é uma forma bem comum de mascarar a culpa.

Coloco aqui trechos de um texto muito bom sobre culpa. Infelizmente não sei a origem para passar a vocês.

“Por detrás de nossas tristezas e frustrações, de nossas insatisfações na vida, de nossos tédios e angústias, está um sentimento, o mais arraigado em nosso comportamento e responsável por grandes sofrimentos psicológicos, que é o sentimento de culpa. O sentimento de culpa é o apego ao passado, é uma tristeza por alguém não ter sido como deveria ter sido, é uma tristeza por ter cometido algum erro que não deveria ter cometido. O núcleo do sentimento de culpa são estas palavras: "Não deveria...".

A culpa é a frustração pela distância entre o que nós fomos e a imagem de como nós deveríamos ter sido. Nela consiste a base para a auto-tortura. Na culpa, dividimo-nos em duas pessoas: uma real, má, errada, ruim, e uma ideal, boa, certa e que tortura a outra. Dentro de nós processa-se um julgamento em que o Eu ideal, imaginário, é o juiz e o Eu real, concreto, humano, é o réu. O Eu ideal sempre faz exigências impossíveis e perfeccionistas. Assim, quando estamos atormentados pelo perfeccionismo, estamos absolutamente sem saída. Como o pensamento nos exige algo impossível, nunca o nosso Eu real poderá atendê-lo. Este é um ponto fundamental.

... Quanto maior for a expectativa a nosso respeito, quanto maior for o modelo perfeccionista de como deve ser a nossa vida, maior será o nosso sentimento de culpa. A culpa é a tristeza por não sermos perfeitos, é a tristeza por não sermos Deus, por não sermos infalíveis; é um profundo sentimento de orgulho e onipotência; é uma incapacidade de lidar com o erro, com a imperfeição; é um desejo frustrado; é o contato direto com a realidade humana, em contraste com as suas intenções perfeccionistas, com os seus pensamentos megalomaníacos a respeito de si mesmo. E o mais grave é que aprendemos o sentimento de culpa como virtude!” (Culpa, a busca da perfeição - Antônio Roberto Soares)

Pessoal, comigo foram anos de terapia para acabar com as minhas culpas, mas valeu cada centavo e cada minuto empregado. E vocês? Vão para o túmulo com as suas? Pensem nisso.

3 comentários:

Thomas Aragão disse...

Texto maravilhoso, fiquei me analisando depois de tudo o que li. Chega a ser assustador a força que a culpa tem sobre nossas vidas.
Abraço.

Rumquatronove disse...

Culpa,eu? É, às vezes;massssss, não é nada "mortal" como vejo acontecendo por aí... Minhas culpas, se não ofendem outras pessoas, eu mesmo perdoo. Acho que isso está muito ligado à uma sexualidade presa também. Fazer o quê se querem se "cobrir"? Gente,todo mundo nú, não quer dizer todo mundo pelado!

Anônimo disse...

Adorei esse texto. Antes de entrar para o pathwork eu sentia culpa por tadas as emoções negaativas que sentia. Achava que não poderia te-las. Mas agora eu sei que essas emoções também são naturais.