"No Egito as bibliotecas eram chamadas Tesouro dos remédios da alma. De fato é nelas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras.”

(Jacques Bossuet).

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O que é Efeito Lúcifer? Parte 2

EfeitoLucifer2

Prosseguindo com o assunto do último post aqui veremos, segundo Philip Zimbardo, os sete processos sociais capazes de tornar uma pessoa mais suscetível a cometer algum tipo de maldade.

1. Dar o primeiro pequeno passo sem pensar: normalmente algo quase insignificante, mas que abre as portas para abusos cada vez maiores e que, quando aumentado pouco a pouco, não se percebe o resultado final. Como um choque de 15 volts.

2. Desumanização do outro: é mais fácil fazer mal a alguém quando não se vê ou não se sabe quem é essa vítima. Os prisioneiros de Stanford não se chamavam John ou Peter, mas 416 e 325.

3. Desumanização própria: quando se está anônimo numa multidão, sua maldade é diluída entre os demais. O antropólogo R. J. Watson estudou 23 culturas em seus processos de ir à guerra. Dos oito povos que iam para a batalha sem pinturas ou ornamentos específicos, apenas um tinha alto grau de violência, isto é: torturavam, mutilavam e/ou matavam seus inimigos. Mas dos outros quinze que mudavam a aparência (ou se escondiam atrás de óculos escuros espelhados e uniformes padronizados), tornando-se anônimos, doze matavam e mutilavam. Ou seja, dos que matavam e mutilavam, 12 entre 13 mudavam a aparência. Mais de 90%.

4. Difusão da responsabilidade pessoal: quando um criminoso é linchado, a culpa é da multidão e não dos socos e pontapés individuais. Mais do que a covardia do grupo, representa a diluição da culpa.

5. Obediência cega à autoridade: como demonstrado por Milgram,  a autoridade também funciona como pára-raios para atribuição de culpa de quem apenas executa ordens.

6. Adesão passiva às normas do grupo: odiar a torcida adversária faz parte do ritual de vestir o uniforme do seu time - mesmo que o seu irmão esteja do outro lado da arquibancada. Mesmo que você odeie uma pessoa que nunca viu apenas por causa das cores que ostenta.

7. Tolerância passiva à maldade através da inatividade ou indiferença: muitas vezes o indivíduo não é o responsável direto pela maldade, mas permite, inabalável, que ela seja praticada.

Quando essa cadeia de eventos ocorre numa situação que não lhe é familiar, ou seja, onde seus habituais padrões de resposta não funcionam, você está pronto para perpetrar o mal - e nem se dará conta disso. Sua personalidade e princípios morais já estarão desligados.

O autor explica que a chave para tal comportamento está na situação em que a pessoa se encontra e na enorme influência que ela tem sobre os indivíduos. O sistema formado pelo conjunto de bases acadêmica, cultural, social e política do indivíduo cria as situações que haverão de corrompê-lo.

No Experimento de Stanford, os papéis de guardas e prisioneiros faziam parte do repertório dos voluntários. Assim que os sorteios foram realizados, cada um encaixou-se ao seu papel automaticamente, de acordo com os estereótipos pré-concebidos.

Para mudar uma pessoa, prossegue, você tem que mudar a situação. E se quer mudar a situação, precisa entender em que parte do sistema está o poder. É necessário identificar e remover do ambiente o elemento dessa equação determinante para que o voluntário assuma o seu papel de guarda sádico - e mantenha-se nele.

Nos mais de trinta anos durante os quais estudou o tema, sua pergunta básica era: o que faz as pessoas agirem de forma errada? Suas conclusões são espantosas, ainda que simples e intrigantes, porque banais.

Imagine que alguém lhe pergunte: "vamos eletrocutar alguém hoje?" Dez anos antes de Zimbardo, Stanley Milgram provou que, uma vez colocados nas condições apropriadas, 65% dos voluntários fritariam pessoas inocentes, as quais nunca viram mais gordas.

Milgram estudou, no entanto, o poder de uma autoridade individual. Zimbardo avaliou, por sua vez, a influência de uma instituição. Trata-se, no final das contas, de um estudo sobre o poder da instituição. E a maioria de nós está dentro de uma instituição a maior parte do tempo.

Fonte: http://www.naopossoevitar.com.br/2009/07/experimentos-em-psicologia-phil-zimbardo-e-o-efeito-lucifer.html

Discordo em parte da conclusão de Zimbardo quanto à instituição ser a causa determinante. Pessoas que tenham a consciência desenvolvida não deixarão extravasar seu lado sombrio, independente de quão forte seja a influência do grupo ou de uma instituição. A “maldade” só virá à tona ou ocorrerá como manifestação da “hipnose” em que vive a maior parte da humanidade e da falta de consciência mais expandida.

Na medida em que desenvolvemos nossa consciência o lado sombra começa a ser administrado, diminuindo e por fim extinguindo essa capacidade tão humana de fazer mal ao outro e também a si mesmo.

Imagem: http://www.naopossoevitar.com.br/

Este blog foi criado para você, leitor. E só saberei se você está satisfeito se comentar os posts, ou então, pergunte, questione e sugira temas ou modificações.

21 comentários:

MARIANGELA BARRETO disse...

Oi Atena,

estudo fantástico e assombroso,diria mesmo assustador!esta cruel faceta existente na nossa condição humana é de uma vulnerabilidade tremenda, e o mais incrivel é que este comportamento independe do acervo de conhecimento intelecual adquirido pelo sujeito..nesta linha, seja quem for poderá tornar-se um sujeito/agente do efeito lúcifer, mas atenção, qualquer um mas não todos, alguns poucos não irão agir como a massa,não transgridirão.... porque?

"Na medida em que desenvolvemos nossa consciência o lado sombra começa a ser administrado, diminuindo e por fim extinguindo essa capacidade tão humana de fazer mal ao outro e também a si mesmo."

Concordo plenamente com você,consciencia, somente ela devidamente desenvolvida e desperta, poderá extinguir/administrar esta faceta que hiberna na fragil condição humana..
este tema é instigante.. parabéns querida..
beijos no coração!.

Anônimo disse...

Fantástica explanação sobre a psicologia comportamental. Assunto tratado com seriedade do texto correto.

Mary Miranda disse...

Atena, querida, como estamos?

Primeiramente, discordo do termo "Lúcifer", para designar coisas ruins. (Uma tradução bíblica mal feita, e nos arrastamos até hoje com a conotação péssima! Como algo que tem a ver com "luz", pode ser mau? Um dia, talvez, até cisme de discorrer sobre isso... rs)
Mas uma vez que eu pule a questão etimológica da coisa, me prendo ao artigo em si, o qual conferi a primeira parte também, ainda agora.
Lembrei, lendo os 7 ítens do efeito, de Nelson Rodrigues, do qual eu divergia de seu pensamento: "Toda unanimidade é burra".
Ao me certificar que TODOS os sete ítens estão coerentes, vejo que Rodrigues estava certo!
Essa coisa de lançar a pedra em nome de uma ideologia de grupo, é perverso, é distorcido, é desumano...
NUNCA devemos agir conforme o "geral", porque o dramaturgo foi soberbo ao definir como "burrice" aquele que segue o rito unânime de uma ideia.
Ninguém pensa igualmente ao outro, portanto, quando levantamos bandeiras, é por cada um que se deve responder, não pelo grupo!
Pertencer a equipes de pensamento ideológico semelhantes, é bom, porém, não a cegueira que causa essa adesão.
Talvez o maior problema seja a vontade de "anulação" que muitos de nós possuímos, que nos leve a retirar dos ombros as responsabilidades, enquanto indivíduos!...
Trabalhar o individual, para agir em grupo e não o contrário, o grupo agir sobre o individual, creio ser a melhor opção.

Maravilhoso artigo o seu, amiga, o qual agradeço por tê-lo postado!

Beijos,
Mary:)

Atena disse...

Mariângela:
Como sempre seus comentários são oportunos ao tema exposto.
Realmente esta faceta humana pode ser e é, muitas vezes, assustadora. O episódio do nazismo com seus campos de concentração deixou isso muito claro.
Obrigadíssima por mais esta visita e beijos no seu coração também

Atena disse...

Antônio Carlos:
Muito honrada com sua visita, espero encontrá-lo mais vezes por aqui.
Fico satisfeita que tenha apreciado.
abraços

Atena disse...

Mary, minha ídola das letras: rsrs
Primeiramente, concordo absolutamente com você quanto ao coitado do Lúcifer, tão vilipendiado há tanto tempo. rsrs
Não sou fã de Nelson Rodrigues porque além de demonstrar muito cinismo em seus textos ele concentrou sua obra na “baixaria humana” e como me declaro apaixonada pela humanidade, tomo as dores por ela. Prefiro os autores que olham mais o lado positivo dos humanos.
Agora, essa afirmação dele sobre a unanimidade está correta mesmo.
Você também está correta quanto à vontade de anulação. Sim, muitos são assim. Lembro que me surpreendeu muito quando os adolescentes começaram a se vestir iguais, como se fosse um uniforme. Na minha época de adolescente a gente fazia questão de “aparecer” usando algo exclusivo. Atualmente é o contrário. Bom, que ingenuidade a minha, nós líamos Schopenhauer, Nietzsche, Victor Hugo, Dante, etc. O que adolescentes leem hoje? rsrs
Enfim, este lado sombrio existe em todos nós e só o desenvolvimento da consciência é que poderá ajudar.
Adorei vê-la por aqui novamente.
Beijos mil

Blogueiros do Brasil disse...

Orgulhosamente programei uma 'chamada' para este ótimo artigo no novo site dos Blogueiros do Brasil. O post será publicado dia 11/01/12 às 15h .


Abraços cordiais.

Unknown disse...

Aproveitando o post,você também crê que haja um reino das Sombras,que tenta atrapalhar e confundir os encarnados na terra ou acho imaginação de alguns livros que afirmam isso??

Atena disse...

Duvendas:
Seres involuídos, quando desencarnam, passam ao outro lado continuando a ser involuídos, portanto do outro lado do véu ou astral como chamam há seres que procuram continuar fazendo "maldades".
Coloco o termo entre aspas porque maldade é um conceito meramente humano.
Tais seres procuram influenciar os encarnados. Se têm sucesso nisso eu não sei, mas os espíritas dizem que sim.

Yolanda Hollaender disse...

Olá, amiga Atena. Li as duas publicações sobre os experimentos de Zimbardo e lembrei-me do filme alemão Das Experiment (A Experiência), que aborda exatamente a situação abordada. Assisti, também, outro filme numa versão americana, mas não me lembro o nome do filme. Continham cenas fortes e pareciam tão realistas, que até me fizeram mal.
Numa situação de confinamento, até se pode entender o lado mau aflorar, mas, na vida real, no dia-a-dia de pessoas comuns, a maldade gratuita me deixa entristecida e temerosa.
Ótimo artigo de pesquisa!
Meu afetuoso abraço,
Yolanda

Atena disse...

Yolanda:
Li uns comentários na internet sobre o filme A Experiência e tive de rir quando li o que uma pessoa escreveu: o filme era ruim porque o roteiro era péssimo, só falava de fantasias. Dizia ainda que na vida real aquelas coisas não aconteciam. Essa pessoa não sabia que o filme se baseava nesse experimento tão real...
É isso, pessoas desinformadas acham que certas coisas não acontecem.
Quanto à maldade gratuita, também me deixa boquiaberta, mas infelizmente ela existe.
beijos e obrigada pela visita

Valéria Mello disse...

Sei não, acredito que eu, eu condições similares a esta experiencia, não faria isto. Era mais fácil eu tentar compor um grupo do "contra" do que me adentrar neste submundo.

Mas, vejo muitas pessoas caminhando para isto,mesmo que de forma, velada. Algumas maldades - aparentemente "pequenas" - tem sido uma constante, daqui e dali.

O vídeo que mostra o comportamento dos chineses: asilos para meninas, um atropelamento onde as pessoas passam pelo corpo da criança caída como se esta fosse um objeto, são exemplos do que cito, somente neste momento. Poderia enumerar muitas outras! No Brasil então! Tenho cá minas dúvidas: o humano é um ser domesticado ou enjaulado?

O Marquês de Sade, escritor francês de cujo nome e pela força de seus escritos deriva a expressão sadismo disse, em um dos seus escritos: "Não há outro inferno para o homem além da estupidez ou da maldade dos seus semelhantes." Até ele, sabia disto.

Atena disse...

É , Val, não podemos negar que o lado sombrio existe em todos nós. Pessoas como você, que já tem consciência mais evoluída certamente agem diferente dos envolvidos na experiência, mas os demais...
Ainda não tinha lido essa declaração do Marquês, o que vem mostrar que mesmo um ser mentalmente comprometido como ele ainda tem um lado lúcido.
Obrigada pela visita.
beijos

Anônimo disse...

Olá Atena!
Muito a propósito, este seu blog; estou preparando mais uma de minhas aulas sobre ética, e uma de minhas angústias sempre se refere a este limite que mais cedo ou mais tarde nos confronta, a todos.
Aproveitando os links pra vídeos, endosso os do Matias Stefano, e torço para que todos sigamos corajosamente, quem sabe expandindo nossas consciências por meio do esforço conjunto, como foi feito na excelente análise suscitada pela discussão sobre os experimentos do Zimbardo. Muitos abraços, e obrigada!
Darlene

Atena disse...

Darlene:
É sempre um prazer receber mais um leitor/a interessado em desenvolver a consciência. Seja bem vinda mesmo.
Esse limite do qual fala só pode ser eliminado através da expansão da consciência, pois esta traz a ética como um dos valores essenciais.
Obrigada pela visita e abraços

Anônimo disse...

Olá, pessoas pensantes rs.

Acho oportuno o nome dado a esse Efeito porque mesmo um anjo iluminado é capaz de cometer loucuras em busca de poder.

Comentando o primeiro ponto, agir ou falar sem refletir pode sim causar efeitos destrutivos, primeiro a si mesmo, depois aos outros.

O Artigo 5º, inciso XLII, diz: "a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de
graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como
crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os
executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem". Portanto, nada fazer pode ser a mesma coisa que fazer o mal, quando se pode fazer o bem.

O amor é bondoso, e só quem ama pode fazer o bem.

Abraços.

Atena disse...

Gabriel:
Seja bem vindo sempre.
Adorei sua frase sobre o amor e a bondade. Concordo plenamente.
Já quanto à omissão... que coisa mais danada. rsrs Como pode fazer mal também e muita gente não se dá conta disso.
Abraços e grata pela visita

Anônimo disse...

Olá Atena, sou o autor dos textos aqui reproduzidos. Vim agradecer a divulgação e colocar-me à disposição caso precise de mais informações sobre o assunto.

Atenciosamente, Rodolfo.

Atena disse...

Seja muito bem vindo, Rodolfo e obrigada pelas gentilezas.
Volte sempre.
abraços

um ser pensante disse...

Puxa Atena, eu não tinha visto que esse artigo tinha segunda parte.

Você não tem Facebook? Eu tenho uma turminha legal lá, e estávamos conversando sobre a influência do meio sobre o indivíduo e vice-versa, e esse artigo veio bem a calhar. Não se importa de eu compartilhar lá né?

Vou divulgar no meu novo portal de conteúdo, o T-udo, se você permitir, claro.

Um abração minha amiga de filosofias :)

um ser pensante

Atena disse...

Meu amigo Pensante:
Que bom encontrá-lo por aqui.
Sim, eu estou no Facebook, vou lhe mandar convite para me adicionar.
Quanto a compartilhar, esteja sempre à vontade para fazê-lo.
Grande abraço