"No Egito as bibliotecas eram chamadas Tesouro dos remédios da alma. De fato é nelas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras.”

(Jacques Bossuet).

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O que é Efeito Lúcifer? Parte 1

EfeitoLucifer

Postei aqui dia 19/12/11 um vídeo excelente sobre a sombra que todo ser humano carrega. Para atestar sua existência hoje compartilho com vocês uma experiência de laboratório conduzida pelo psicólogo Philip Zimbardo.

Em 1971 Zimbardo estava pronto para ver sua teoria sobre a maldade na prática: em 14 de agosto teve início um dos mais controversos Experimentos em Psicologia feitos até hoje: o Estudo da Prisão de Stanford.

Com um anúncio no jornal, Zimbardo e sua equipe amealharam 75 candidatos para uma pesquisa onde seriam estudadas as condições dentro de uma prisão. Através de testes físicos e avaliações psicológicas, eles escolheram os 24 voluntários, dentre os mais saudáveis do grupo, que receberiam US$ 15,00 por dia de participação.

Um cara-ou-coroa dividiu o grupo entre guardas e prisioneiros, colocando-os dentro ou fora das grades de uma cadeia cenográfica montada no subsolo da própria universidade. Depois do sorteio, os voluntários eram instruídos a aguardar em casa o início do experimento.

Sem qualquer outro aviso, os prisioneiros eram buscados em suas casas pela própria polícia de Palo Alto, na Califórnia. Sob a "acusação" de assalto à mão armada, eles eram levados à delegacia algemados em carros-patrulha para serem fichados, tirar as impressões digitais e as fotos características.

Já na cadeia, os prisioneiros eram chamados apenas por números bordados em suas roupas - iniciando seu processo de despersonalização, a que retornaremos mais tarde. Todos usavam uniformes apertados, gorros de lã e eram obrigados a carregar bolas infláveis a maior parte do tempo, para que se sentissem desconfortáveis. Uma corrente atada a um dos tornozelos lembrava-os, constantemente, sua condição de prisioneiro.

Aos guardas foram fornecidos bastões de madeira, roupas características e óculos escuros espelhados, para que evitassem contato visual direto com os prisioneiros.

Nas instruções que lhes deu um dia antes do experimento, Zimbardo alertou-os que não poderiam machucar os presos. Disse-lhes: "Vocês podem criar nos prisioneiros a sensação de tédio, algum grau de medo e o sentimento arbitrário de que suas vidas são controladas por nós, pelo sistema e que eles não têm qualquer privacidade. Vamos tirar suas individualidades em vários níveis. Geralmente isso tudo leva à sensação de impotência, ou seja, nessa situação nós teremos todo o poder, enquanto eles não terão nenhum".

Um dos guardas foi designado Diretor da Prisão, enquanto que o próprio Zimbardo era o Superintendente. Mesmo sob sua supervisão, o experimento fugiu ao controle rapidamente. Ali ele pôde compreender o que acontecia a pessoas boas quando colocadas numa situação ruim.

Numa irracional escalada de brutalidade, os guardas tornaram-se sádicos algozes daqueles que, dias antes, eram apenas seus colegas de universidade. Eles forçavam os detentos a exercícios repetidos, sem motivo aparente. Proibiam os prisioneiros de sair das celas para suas necessidades fisiológicas e os impediam de esvaziar suas latrinas, causando rápida deterioração nas condições sanitárias do presídio.

Em 36 horas o primeiro preso teve um colapso nervoso, chorando, gritando e com o raciocínio totalmente perturbado, precisando ser removido imediatamente.

Os guardas tornaram-se cada vez mais cruéis com o desenrolar do experimento. Às vezes retiravam os colchões das celas como forma de punição, forçando os presos a dormir diretamente no concreto. Outros eram obrigados, ainda, a andar nus pela prisão.

Certa vez, o prisioneiro 416 recusou a alimentação oferecida e foi trancado num armário apertado carinhosamente batizado de solitária. Para enervar os presos e criar conflitos internos, os guardas disseram que só soltariam o colega isolado se os demais entregassem seus lençóis. Todos se recusaram.

Tão estranha quanto a crueldade cultivada pelos guardas era a passividade demonstrada pelos prisioneiros. Zimbardo explicou que eles internalizaram seus papéis a tal ponto, que sofriam passivamente o tratamento sádico, covarde e humilhante que lhes era imposto. Quando algum deles pedia para sair, era submetido ao "comitê de liberdade condicional", onde seu caso era "julgado".

Invariavelmente o pedido de condicional era negado (caso fosse aceito, ele sairia sem receber o pagamento por sua participação) e, por incrível que pareça, o prisioneiro aceitava candidamente a decisão e voltava à prisão. Ele parecia esquecer-se de que estava ali por sua própria vontade e, assim sendo, poderia ir embora no momento que bem entendesse, independentemente da decisão de qualquer comitê fajuto.

Imerso no seu papel, Zimbardo parecia não se dar conta do que acontecia com seu experimento. Mais de cinquenta pessoas já haviam visitado as instalações da "prisão", até que uma delas - e apenas uma delas! - chamou sua atenção para o tipo de atrocidades que se cometia ali. Disse, ainda, que o próprio Zimbardo, mesmo parecendo alheio, era responsável pelo que acontecia com aqueles rapazes.

Como que despertado de seu torpor, Zimbardo encerrou o experimento na manhã seguinte. Era ainda o sexto dia, de um total previsto de quatorze.

A maioria dos guardas mostrou-se desapontada com o prematuro encerramento das atividades. Muitos dos prisioneiros estavam psicologicamente abalados. Cinco tiveram colapsos nervosos.

Zimbardo explica, assim, que a maldade é uma questão de poder. É o exercício de poder para intencionalmente infligir a alguém o mal psicológico ou físico. Ele identifica os sete processos sociais capazes de tornar uma pessoa mais suscetível a cometer algum tipo de maldade. (próximo post)

Fonte: http://www.naopossoevitar.com.br/2009/07/experimentos-em-psicologia-phil-zimbardo-e-o-efeito-lucifer.html

Zimbardo chamou de EFEITO LÚCIFER à estranha e onipresente força que eventualmente nos faz cruzar a tênue fronteira entre “o bem e o mal”.

Reflitam a respeito. Todos nós temos nossa parte sombria!

Imagem: http://www.naopossoevitar.com.br

Este blog foi criado para você, leitor. E só saberei se você está satisfeito se comentar os posts, ou então, pergunte, questione e sugira temas ou modificações.

19 comentários:

BELLA! disse...

bom texto!

Valéria Mello disse...

Eu vou contar um caso pra explicar minha experiencia diante do que vc fala. Eu conheci uma pessoa prestes ao suicídio. Chamei atenção das pessoas ao seu desta pessoa para a gravidade do fato e elas simplesmente, choraram. Uma outra, diante de uma ordem de despejo recebeu a oferta de emprego e renda. Mas, um outro sujeito foi lá e pagou e aluguel.Ouvi uma pessoa dizer que não se separava do companheiro porque tinha medo da dor. Com a situação prorrogada, todos voltaram ao seu lugar de submissão à melancolia. E assim, sucessivamente, em várias situações vi esta atitude omissa, meio zumbi, estagnada diante da situação que pedia reação. Noto também que esta atitude, de certa forma, é generalizada. Como válvula de escape culpam ou responsabilizam "Deus" e/ou igualmente, o destino. É mais fácil do que assumirem responsabilidade sobre seus atos. Um dia eu literalmente apelei e ouvi coo resposta: "eu sou assim, o que posso fazer?". Atena querida, tenha hora que eu acho que desci no planeta errado.... :( e não sei como agir. Então, o que era pra eu dar duas braçadas e atravessar o rio, tenho que dar mil, e muitas vezes, parar pra descansar. É quando me vejo, no bolo.

Valéria Mello disse...

E se eu tivesse vivido uma experiencia deste tipo, com certeza absoluta, teria tomado uma atitude das bravas!

Atena disse...

Bella:
Agradecida. Volte sempre.
abraços

Atena disse...

Val;
Você não nasceu no planeta errado, simplesmente é consciente. Querida, ter consciência também tem seu ônus, às vezes pesa nos ombros quando a gente olha em volta e vê tanta barbaridade ou estupidez.
No post “Assumir a responsabilidade por suas escolhas” abordo essa péssima característica humana de culpar os outros e o que é exterior por suas mazelas. Algo só resolvido quando se desenvolve o autoconhecimento e a consciência.
Muito pertinente seu comentário, acrescenta ao post, obrigada.
Beijos

MARIANGELA BARRETO disse...

Oi Atena,

tema fantástico e complicadissimo!
o que chamamos de sombra é uma faceta assustadora do ser humano.Esta experiencia que você relata é terrivelmente real e humana.Hannah Arendt filósofa judia e alemã, que foi perseguida pelos nazistas,escreveu uma obra sobre a Banalidade do mal,a partir do julgamento de Eichmann, alemão responsável pela execução da operação "solução final" que dizimou milhares de prisioneiros dos campos de concentração.O "surpreendente" é que os torturadores,assassinos frios,guardas,enfim todos os envolvidos,eram pessoas ditas "normais", pessoas "boas", bons pais, bons amigos mas capazes de maldades inimaginaveis, assim como "normais" eram os estudantes que fizeram parte da experiencia que vc relata no seu artigo..

Concordo com você quando diz que somente o processo de autoconhecimento e despertar da consciencia poderia reverter este efeito sombrio da condição humana,acredito mesmo amiga, que somente a luz da consciencia desperta, será capaz de reverter este processo sombrio e iluminar a escuridão que também faz parte da dualidade humana..

beijos no coração!

Atena disse...

Mariangela:
Bem lembrado: os torturadores nazistas! O próprio Hitler dizem que era carinhoso com seu cão. Em compensação, com os judeus ...
Por falar em banalidade do mal, você me lembrou que atualmente nós estamos enfrentando a banalidade da violência, graças à Hollywood e à mídia que se compraz em estimular essa faceta tão sombria do ser humano.
Gostei demais de seu comentário, obrigada.
Mil beijos

Cidadão Araçatuba disse...

Fantástica a postagem, e mais ainda a palestra do psicólogo-sociólogo-antropólogo!
Não dá para imaginar o quanto podemos descer na escada que nos leva ao "inferno".
Ou pior ainda, o quanto podemos descer para levar outrem lá!
Estou pensando em postar o vídeo, o problema é que são 23 minutos e ele fala muito rápido, rs... Mas valeu a pena cada segundo,que lição heim!
Obrigado por compartilhar!
Grande Abraço!

Unknown disse...

Oi Atena
Acabei então de encontrar a base sobre a qual foi feito o filme "Detenção" ("The Experiment"), com o mesmo ator de "O Pianista".
São pouquíssimas diferenças, as semelhanças são infinitamente maiores.

Ótimo artigo
Um abraço, minha amiga de sempre :-)

Atena disse...

Oi, Cidadão:
O vídeo é uma cacetada, não? rsrs Por que não postá-lo? Mesmo o cara sendo uma metralhadora pra falar, sempre dá para parar as legendas para se ler com calma.
Esse assunto realmente dá pano pra mangas. Acho muito importante as pessoas se conscientizaram do seu lado sombrio. É o primeiro passo para poder se defender dele.
Agradecida pela presença e comentário.
Grande abraço

Atena disse...

Um:
Não assisti esse filme, portanto não posso dizer nada a respeito. Vale a pena assisti-lo??
Obrigada pela visita.
abração

Tiozão das Batidas disse...

Orgulhosamente programei uma 'chamada' para este ótimo artigo no novo site dos Blogueiros do Brasil. O post será publicado dia 10/01/12 às 18h .


Abraços cordiais.

Atena disse...

Tiozão:
Obrigadíssima.
Grande abraço

Beth Muniz disse...

Oi Mestra,
Guardadas as devidas proporções a história me lembra o filme Ensaio sobre a Cegueira, do Saramago.
Concordo com o Zimbardo. Temos visto isso ocorrer em vários lugares e situações, no Brasil e no Mundo. O mais recente episódio foi agora em São Paulo.
Poder e dinheiro, ou a falta deles, quando se dá a importância que não deveriam ter, podem causar estes efeitos. É preciso estar atento...
Beijão.

Atena disse...

Cara Beth:
Com certeza precisamos estar sempre atentos. Dizem que a carne é fraca. rsrs
Perdi de ver esse filme quando estava nos cinemas e posteriormente esqueci-me de ver nas locadoras. Vou providenciar.
Grande beijo e obrigada pela visita

Anônimo disse...

se fosse consciente, não julgava!

Atena disse...

Anônimo:
Desculpe, mas não entendi o que quis dizer. Quem não julgava? Julgar o que?

Ale Costa disse...

Gostei do blog, em especial desta postagem Parabéns pela iniciativa de divulgar informações importantes.
Ale Costa
http://ordem-natural.blogspot.com

Atena disse...

Ale:
Obrigada pela visita e apoio.
Seja sempre bem vindo e abraços