Na última postagem expressei a opinião de que não vivemos (países ditos democráticos) uma real democracia. No post de hoje apresento em sequência um assunto que está intimamente relacionado com o que afirmei anteriormente.
Como comigo a sincronia funciona mesmo, vi na internet uma referência a um documentário que chamou-me a atenção e após assisti-lo todo (4 horas de duração ) passo a resumir aqui.
The Century of Self (o século do ego) é um premiado documentário britânico de Adam Curtis. Ele se concentra em como a obra de Sigmund Freud, Anna Freud e Edward Bernays influenciou a forma como os governos e as corporações têm analisado, tratado e controlado o povo na era da democracia de massa.
O Século do Ego faz perguntas profundas sobre as raízes e os métodos do consumismo moderno, democracia representativa, marketing e suas implicações. Ele também questiona a maneira moderna de vermos a nós mesmos, as atitudes em relação à moda e à superficialidade.
Edward Bernays (sobrinho de Freud), considerado pela revista Life Magazine como uma das 100 pessoas mais influentes do século XX e considerado o pai da ciência chamada Relações Públicas, foi a primeia pessoa (após 1ª Grande Guerra) a usar as ideias de Freud sobre a mente para manipular as massas.
Com base nas ideias de seu tio, ele ensinou aos empresários americanos como podiam fazer com que as pessoas desejassem coisas das quais não necessitavam. Estava nascendo a ideia política de “como contolar as massas”: satisfazendo os desejos inconscientes das pessoas para torná-las felizes e dóceis. Era o pontapé inicial da era do consumismo.
Logo de início Bernays já demonstrou ser um baita marqueteiro pois criou o termo Relações Públicas substituindo a palavra propaganda já que esta estava mal vista por causa de seu uso pelos alemães.
A certa altura se perguntou se poderia ganhar dinheiro manipulando o inconsciente das pessoas e como assessor de um grande industrial do fumo lançou-se à sua primeira tarefa: convencer as mulheres a fumar em público (um tabu na sociedade da época). Convencido de que o cigarro é um símbolo fálico com idéias de poder, independência e liberdade embutidos nele, percebeu que poderia fazer com que o cigarro fosse adotado pelas mulheres como um desafio ao poder masculino. Com uma certeira e espalhafatosa jogada de marketing o conseguiu, aumentando incrivelmente as vendas de cigarro para o seu contratante.
Até então a publicidade se focava nas necessidades do povo e era dirigida ao seu lado racional. Bernays iria mudar essa ótica, pois já que seu tio tinha dito que o homem é controlado por impulsos irracionais, ele percebeu que poderia influenciar as pessoas apelando para o seu lado inconsciente e desenvolveu técnicas de persuasão a partir desses impulsos. É o que vemos acontecer até os dias atuais na publicidade e propaganda.
Além dos grandes empresários, Bernays sempre esteve muito ligado aos governos dos EUA. Em 1917 foi contratado pelo então presidente Woodrow Wilson para criar uma campanha para influenciar os americanos a apoiar a entrada de seu país na primeira guerra mundial. Em seis meses um imenso repúdio ao povo alemão estava instalado na América.
Em 1930, um banqueiro da Lehman Brothers, considerando que seu banco estava faturando pouco, decidiu: nós precisamos mudar a cultura americana da necessidade para o desejo, as pessoas têm de ser treinadas para desejar novas coisas. O encarregado de mudar tal mentalidade foi Bernays. Este, então, criou uma campanha para convencer as pessoas a pegar empréstimos para comprar ações (o que mais tarde teria suas consequências no crash da bolsa de 29).
Em 1929 Hoover é eleito e diz para seus assessores em RP (Bernays já havia feito vários discípulos) que deveriam transformar as pessoas em “máquinas de felicidade em constante movimento” ou “máquinas-chave para o progressso econômico”. Estava sendo criada uma nova maneira de como dirigir a democracia de massas, sua chave era o consumismo per si.
As ideias de Matthew Lipman (filósofo americano influente na época) e Bernays contaminaram a democracia e a transformaram num paliativo – “se continuar-se a estimular o lado irracional dos humanos, a elite pode continuar fazendo o que quiser” (as massas não têm capacidade racional para governar-se, pois são comandadas por impulspos primitivos).
A ideia de democracia para Bernays era manter as relações de poder metendo-se na vida psicológica das pessoas quando isso fosse necessário. Incutiu no povo a crença de que não poderia haver democracia sem o capitalismo - “a democracia se reduz de uma cidadania ativa para um consumidor passivo”.
As barbáries nazistas constatadas durante a Segunda Grande Guerra levaram os governantes americanos a voltar à ideia de que as massas são controladas por inconscientes perigosas forças destruidoras. O governo americano, grandes corporações e a CIA uniram-se para desenvolver técnicas que controlassem a mente do povo americano porque temiam que o lado humano irracional poderia tomar conta do povo e repetir o comportamento dos alemães durante a guerra.
Gigantesco experimento social para controlar a vida mental interior do povo americano foi criado, o programa “Saúde Mental da Nação” (lei aprovada pelo presidente Truman em 1946).
Centenas de psicanalistas foram treinados para aplicar as ideias de Anna Freud. Ela acreditava que era possível ensinar às pessoas como controlar as irracionais forças internas. Havia realizado a terapia de algumas crianças e considerou que seu método era válido (há que ensinar às crianças a ajustar-se às regras da sociedade), o que foi desmistificado posteriormente, mas, infelizmente, anos mais tarde.
No final da década de 1950 a CIA investiu milhões de dólares nos departamentos de psicologia das universidades americanas,financiando secretamente experimentos para controlar as forças internas das pessoas. Destacou-se nesta época Ewen Cameron que, como outros tantos psicanalistas, acreditava que dentro do ser humano residiam forças que ameaçavam a sociedade. Acreditava também que era possível eliminar da memória dos indivíduos tudo aquilo, que no seu critério, não era positivo à sociedade. Com este objetivo submeteu seus pacientes a doses maciças de eletrochoques, consumo de LSD e outras drogas procurando apagar a memória deles e posteriormente incluir nessa “tabula rasa” novos conteúdos, novos comportamentos. O resultado de suas experiências foi um completo desastre, pois deu origem a uma dezena de pessoas desmemoriadas de sua vida prévia e somente com a habilidade de repetir frases como: “estou contente comigo mesmo”.
Outros experimentos financiados pela CIA também resultaram num fracasso. Os estudiosos envolvidos finalmente começaram a se dar conta do quão difícil era comprender e controlar os mecanismos da mente humana.
Em 1978 um grupo de economistas e psicólogos da Stanford Research University decidiram encontrar uma maneira de ler, medir e cumprir os desejos dos novos imprevisíveis consumidores (os que queriam a autoexpressão). Foi criado então o “marketing por estilo de vida”.
Novos instrumentos de pesquisa psicológica do consumidor foram criados (os chamados grupos de discussão – focus groups) para explorar os sentimentos dos grupos divididos pelo “estilo de vida”. Posteriormente as empresas passam a fabricar produtos que permitam aos componentes desses grupos expressar o que consideram sua individualidade. A geração que uma vez já tinha se revoltado contra o consumismo, agora se rende ao mesmo porque o ajuda a ser a si mesmo (filosofia do eu centrado em si próprio).
Resumindo, no documentário é constatado que para criar-se uma sociedade estável é preciso reconhecer que o cidadão comum compensa suas frustrações gastando em auto-gratificações (consumo de produtos).
Dois exemplos da influência de Bernays:
- Achava que em vez de tentar dinminuir o medo das pessoas em relação ao comunismo este devia ser induzido e incentivado porque, desencadeando medos irracionais, faria americanos leais ao Estado e ao capitalismo de maneira a tornar-se uma arma na “guerra fria”.
- Seu papel no golpe de Estado da Guatemala em 1953, que culminou com a derrubada do presidente Jacobo Arbenz, eleito com a promessa de promover a reforma agrária em terras da United Fruit Company. Por meio dos jornais, Bernays foi capaz de aumentar o apoio da população ao golpe e à invasão do exército norteamericano, porém não pôde evitar a guerra civil que durou 36 anos e resultou em mais de um milhão de guatemaltecos mortos. (http://www.ip.usp.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=1927:v3n1a09-a-engenharia-do-consentimento&catid=340&Itemid=91)
Bernays nunca realmente acreditou que a democracia podia funcionar.
O restante do documentário ainda mostra as influências das ideias freudianas em outros eventos, tanto nos USA como na Europa desde a época da Primeira Guerra Mundial, mostrando magistralmente como tem funcionado a manipulação das massas seja pelos políticos ou pelas empresas visando o consumo.
E então? Continuaremos sendo massa de manobra? Até quando?
Há que expandir a consciência para que a manipulação acabe!
Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=HjzMHt2s4cI&feature=fvwrel
Imagem: eakd.wordpress.com
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12 comentários:
Sim Mestra, me interessa muito.
A Era dos Extremos, em todos os sentidos:
Expansão do imperialismo – fase superior do capitalismo, que quando percebe a necessidade, massacra alguns deles, para que outros sobrevivam (Wall Street). A era do “ter” em lugar do “ser”. A venda imagem (distorcida) do que seja felicidade. O consumismo desenfreado. A manipulação das informações. A preparação das massas para aceitarem a guerra como uma forma de conquistar a paz futura (O Príncipe). A instauração de padrões de comportamento (beleza, pureza, virtude e castidade). A ideia de que não há democracia perfeita, a exceção daquela que idealizamos e tentamos vender como modelo, mesmo que para isso tenhamos que invadir países e matar gente, como os americanos do norte gostam de fazer (Guatemala, Nicarágua, El Salvador, Chile, Ásia, África, etc.).
Eu já havia lido alguma coisa neste sentido. Mas, a sua capacidade sintetizar as ideias, nos faz conhecer e compreender mais. Obrigada.
Como acredito que não há perfeição, seja no espaço que for, torço apenas para que nos tornemos seres humanos melhores, comprometidos mais com a conquista coletiva, e menos com as benesses individuais.
É que enquanto a maioria não compreender que política é uma ciência, que queiramos ou não, rege as nossas vidas e o mundo. Tudo está entrelaçado e conectado. Não há para onde escapar.
E o maior perigo para a humanidade, é a venda da ideia de que política é coisa para políticos. Grande engano.
Às vezes eu penso que a massa gosta de ser manipula. Dá menos trabalho...
Atualmente, para muitos, é melhor gastar tempo com bobagens na internet, e deixar a vida real de lado.
E, me desculpe se falei, também, bobagens. rsrsrs
Beijo.
Valeu!
Beth querida:
Comentário absolutamente pertinente.
Você não imagina como fiquei enojada assistindo esse documentário. Já sabia, é claro, que os marketeiros utilizam a psicologia para o seu trabalho, mas ter diante dos olhos tudo o que vi e ouvi, foi demais para a D. Quixote aqui. rsrs
Já na faculdade ignorei o Freud porque algo me dizia que sua teoria não era a melhor e agora constatando tudo o que de mal suas ideias causaram fiquei pasma.
Esse tal de Bernays devia ser desenterrado e crucificado em praça pública. Arre!
Você está coberta de razão quando diz que a política rege as nossas vidas, infelizmente, de uns tempos para cá, a massa resolveu ignorá-la em prol de assuntos banais e que não acrescentam nada.
Lembro ainda de meu pai toda santa noite ouvindo A Hora do Brasil para se manter informado. Que diferença para os dias de hoje.
Parece que as pessoas só se importam em reclamar do que está lhes incomodando, mas fazer algo a respeito ... Como você disse, parece que gostam de ser manipulados.
É a falta de consciência a causa desse marasmo e principalmente consciência política.
Enfim ...
Ah, você nunca fala bobagens.
Procure assistir o documentário, considero-o imperdível. Eu o assisti aos poucos para não cansar.
Beijocas e obrigada pela participação
Pelo seu comentário acima pra você Freud é uma fraude..rsrsrsr ou em parte eles está certo e em outros pontos sua visão não é valida,você acha Jung mais profundo é menos superficial???
Salve, Duvendas.
Não, Freud não é uma fraude. Simplesmente acho que toda uma teoria baseada somente num aspecto humano - a sexualidade, não pode estar 100 por cento correta. Acho que ele limitou o ser humano. Somos mais complexos.
Também não levou em conta o aspecto espiritual. Isto considerado, Young é mais abrangente e mais profundo.
abraços e obrigada pela visita
Quando se trata de polica.. eu não comento muito.. mas Freud.. eu realmente não gosto muito..
Sinceramente me deu raiva quando eu li essa coisa da mulher invejar o pênis.. ssrsrsrs.. achei ridículo...e não deu vontade de ler mais nada.. prefiro Young..
ahhh quando der tem posts novos no meu blog se quiser olhar..
Oi, Florzinha;
Pois é, eu também quando ouvi pela primeira vez, na faculdade, não fiquei com raiva, mas achei ridículo. Na minha opinião o homem é que tem inveja do útero já que é onde se carrega uma nova vida. rsrs
beijos
Atena, excelente texto, muito interessante mesmo. Qualquer um que não seja um analfabeto funcional sabe como o tal do Mercado tenta nos manipular inventando produtos dos quais não precisamos.
Vou guardar este teu texto para publicá-lo também lá no blog da CPFG, ok?
por coincidência(ou sincronicidade...rss) estou publicando um ensaio lá no meu blogue sobre o tema "Freud e o ocultismo", também interessante.
beijos e parabéns pelo texto.
Obrigada pela apreciação, Edu.
Sinta-se sempre à vontade para "carregar" meus textos, pois os considero de utilidade pública.
Vou ler, sim, o que você postar sobre o velho Freud, figura sempre polêmica. rsrs
Beijos e obrigada pelos comentários.
Orgulhosamente publiquei uma 'chamada' para este ótimo artigo no novo site dos Blogueiros do Brasil.
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http://omelhordos.blogueirosdobrasil.com/
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Abraços cordiais.
Muito agradecida, Tiozão.
abraços
Baixar o Documentário - O Século do Ego (The Century of The Self) - http://mcaf.ee/pidt3
Obrigada por sua contribuição, Bruna.
Seja bem-vinda.
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